terça-feira, 23 de outubro de 2018

O espírito de nossos tempos ou verde-amarelo manchado de sangue

Existe um povo que a bandeira empresta
P'ra cobrir tanta infâmia e cobardia!...
E deixa-a transformar-se nessa festa
Em manto impuro de bacante fria!...
Meu Deus! meu Deus! mas que bandeira é esta,
Que impudente na gávea tripudia?
Silêncio. Musa... chora, e chora tanto
Que o pavilhão se lave no teu pranto! ...
Auriverde pendão de minha terra,
Que a brisa do Brasil beija e balança,
Estandarte que a luz do sol encerra
E as promessas divinas da esperança...
Tu que, da liberdade após a guerra,
Foste hasteado dos heróis na lança
Antes te houvessem roto na batalha,
Que servires a um povo de mortalha!...
(Castro Alves, Navio Negreiro)

Nossa bandeira jamais será vermelha!
Gritou o cidadão de bem que espanca a esposa e os filhos.
Nossa bandeira jamais será vermelha!
Bradou a socialite que não assina a carteira de trabalho da empregada.
Nossa bandeira jamais será vermelha!
Exclamou o badboy que espanca LGBT's.
Nossa bandeira jamais será vermelha.
Disse o empresário sonegador de impostos.
Nossa bandeira jamais será vermelha.
Vociferava o racista, espumando de ódio.
Nossa bandeira jamais será vermelha.
Concordou o latifundiário que toma as terras de indígenas e explora camponeses.
Nossa bandeira jamais será vermelha.
Entre risos, se cumprimentavam banqueiros e especuladores da bolsa.
Nossa bandeira jamais será vermelha!
Esbravejou do altar para o templo lotado e para milhares de casa pelo sina de TV, o mercador da Fé, o lobo travestido de ovelha, a lucrar com a religiosidade de nosso povo.
Nossa bandeira jamais será vermelha.
Em uníssono clamam as vozes do atraso.
E muita gente, muita mesmo, concordou, sem saber, que, o que querem os vermelhos não é mudar as cores de uma bandeira, mas mudar esse país. Torná-lo verdadeiramente de todos, porque durante toda a sua história, ele tem sido de uns poucos.
Queremos a bandeira verde-amarela, com seu círculo mostrando o belo céu de nossa terra, mantendo até mesmo a frase, que ali, nos lembra, o tipo de gente que sempre esteve no comando... Porque, não devemos esquecer a história que nos construiu.... Queremos que ela permaneça como está, mas não a queremos mas, suja, manchada, aviltada pela exploração do homem pelo homem, pela violência que vitima a cada dia as pessoas, apenas por serem diferentes.
Queremos uma nação que estenda as mãos aos irmãos da América Latina e que trilhe seus caminhos, sem a tutela de qualquer imperialismo, seja o ianque, seja qualquer outro. Um país, onde todos possam ter oportunidades, e que possamos ser mais iguais, de verdade. Queremos creches e escolas para nossas crianças e universidades para nossos jovens, queremos saúde, segurança e acima de tudo liberdade para ser o que quisermos.
Queremos negar esse exacerbado individualismo, que só nos permite enxergar o outro como concorrente e permitir que possamos nos assumir, enquanto coletividades, onde eu possa ver o outro como parceiro, para possibilitar que cresçamos todos juntos.
Dito isto, não precisa temer pela cor da bandeira. Precisa temer, sim a desigualdade, o ódio, o preconceito e todos os males que hoje andam a solta e que procuram se esconder, sob a auriverde bandeira brasileira.
Comecei reproduzindo um trecho do poema Navio Negreiro de Castro Alves. Não posso deixar de pensar nessas linhas quando vejo os gritos de que a bandeira não será vermelha. Como diz Alves, infelizmente, nossa bandeira ainda é usada como mortalha dos pobres e oprimidos, das mulheres e das LGBT's, dos negros, enfim de todo nós, trabalhadores.