sexta-feira, 23 de fevereiro de 2024

Sobre desvalorizar o trabalho alheio

Um dos clássicos da literatura brasileira é o Memórias Póstumas de Brás Cubas. Nele, do além, o personagem título narra sua vida, a começar, inusitadamente, pela sua morte, para daí, voltar a ordem que se espera: nascimento, infância adolescência, maturidade. 
Escrito por Machado de Assis, o livro destila uma fina ironia, a qual, apenas um morto, sem ter mais que preocupar-se com os julgamentos da sociedade poderia ter. 
Ele apresenta um retrato de nós, brasileiros, que não é tão bom quanto gostaríamos. As enfim, abordo, Machado de Assis e seu Brás Cubas, para adentrar no tema do valor do trabalho. 
Em certa passagem, Brás escapa de um acidente sério, com sua montaria, um jumento, no qual poderia ter morrido. Ele é socorrido por um almocreve. Almocreve é o trabalhador cujo ofício é, justamente, conduzir animais de carga.
O trabalhador o ajudou e depois cuidou do animal para que ele seguisse seu caminho. 
No começo, Brás Cubas, visivelmente abalado pelo acontecimento, cogitou dar-lhe três moedas de ouro como forma de agradecimento. 
Com o seguir da narrativa, vê-se que tal ato começa a ser questionado. 
Afinal, cuidar de jumentos, mulas e outros animais, era o trabalho dele, cismava Cubas. E ainda que o acidente, felizmente, não fora nada demais. 
Rapidamente, cogita dar-lhe apenas duas moedas, depois uma. Depois, olhando para pobreza do trabalhador, acha que uma moeda de ouro apenas, ainda seria muito para alguém, que, pensou Cubas, nunca tiveram uma mas mãos. 
Por fim, enfiou um cruzado de prata nas mãos do homem. Este agradeceu efusivamente. 
Vendo a reação do homem, Brás Cubas sentiu-se um tolo pra ter dado a este tanto dinheiro. Sentindo umas moedinhas de cobre no bolso, convenceu-se de que estas seria a paga adequada. E se foi pensando no quanto era perdulário. 
Esse trecho é algo tão comum. Geralmente, tomamos o trabalho dos demais como sendo algo a ser pouco valorizado. São comuns comentários como, paguei tanto para o profissional fazer só isso. E ninguém pensa no quanto de preparação está envolvida naquele trabalho, na situação de vida do trabalhador, de suas necessidades. Não temos sequer a empatia para nós colocarmos em seu lugar. 
Nesses dias em que, nós servidores técnicos administrativos em educação estamos lutando por um novo PCCTAE, o governo agiu conosco como Brás Cubas, com a diferença de que nem mesmo os cobres sobrando no bolso, ele acha que merecemos. Desvaloriza nossa categoria, deixa-nos sem reajuste e sem uma resposta sobre a reformulação da carreira. 
Somos a maior carreira do executivo. Estamos na base da educação superior. Sem nós, não há universidade. Já passou da hora de mostrar que temos valor.Que a educação não pode acontecer sem nós é uma lição que este governo precisa aprender! 
Sem Reformulação, vamos parar a educação! 

domingo, 18 de fevereiro de 2024

Reflexões de um domingo qualquer

Hoje, quando saí para passear com o Ben, meu filhote pet, vi uma cena curiosa. Bailando pela rua, impulsionada pelo vento uma sacola plástica. Dessas de supermercado. Ela se movia graciosamente, sem peso, pelo ar, fazendo piruetas como uma borboleta enorme e esbranquiçada. 
De repente, uma lufada de vento mais forte a levou bem para o alto. Uma imagem inusitada e bonita, até, daquela sacola, que jogada fora, descartada sem cuidado, agora se elevava aos céus, contrastando entre o azul e as nuvens. 
Isso me pôs a pensar. Muito tempo depois que você se for, a sacola plástica que trouxestes do supermercado com as comprinhas que fizestes, ainda estará por aqui. Ainda será um problema de políticas públicas, quando ninguém mais se lembrar de você.
E por vezes, que coisa, né? A gente tem uma visão de si mesmos tão superestimada. O livro sagrado adverte: lembre-se de que tu és pó. Não deixa de falar sobre os humildes, os mansos. E o que mais vemos por aí? Gente orgulhosa, que bate no peito, veja só, afirmando ser bons cristãos. Geralmente, quem faz isso trata Deus como empregado, ou pior, como jagunço. 
Gosto do Eclesiastes, nele tem um versículo perfeito: "Para o homem não existe nada melhor do que comer, beber e se alegrar no trabalho que realiza".
É isso. A grandeza, o reconhecimento por parte dos outros é muito bom. Mas nada pode ser melhor do que a desfrutar das coisas simples da vida. 
Não somos descartáveis. Nosso valor excede o das sacolas plásticas. Então não percamos nosso tempo com coisas enfadonhas, que, diferente da sacolinha que vai durar mil anos, a gente vive brevemente. Tratemos de viver bem, de ajudar uns aos outros, pois a vida humana é transformada pela força das ações coletivas.