sábado, 29 de dezembro de 2018

2019

2018 está terminando. Neste ano tivemos a efeméride dos  200 anos de Marx, comemoramos 170 anos do Manifesto Comunista. E o velho barbudo parece estar mais em alta do que nunca. Pelo menos do ponto de vista de seus detratores. Na ultima eleição presidencial novamente vimos o espectro do comunismo assustar os brasileiros. Mas que comunismo? De quem tem medo os brasileiros que foram às urnas apostar em um projeto reacionário e neofascista tão somente porque ele seria a opção para combater o comunismo?
Já tem algum tempo que a direita brasileira vem flexionando os músculos e apontou como inimigo o mesmo para o qual voltou suas baterias em 1964: o comunismo.
Mas, estamos em 2008, por isso o inimigo precisava de uma nova roupagem, afinal não existe mais uma União Soviética tramando a dominação mundial. O que fazer então? Os ideólogos dessa nova direita (gente preguiçosa, que não lê nem mesmo os clássicos do pensamento conservador, que dirá Marx e outros), alardearam o marxismo cultural como a fantasia da vez utilizada para destruir a família, arrasar Deus e deitar ao chão as bases da nação brasileira.
Muita gente boa acreditou nessa lorota. Combinado ao fetiche de andar armado e uma tendência ao autoritarismo tão presente na alma do brasileiro temos os ingredientes que ao meu ver ajudaram na vitória eleitoral do fascismo.
E porque a aposta da elite brasileira no neofascismo? Ora a burguesia brasileira não comprou a ideia do perigo comunista. Sabe que não há nada parecido no horizonte. Ela auferiu lucros enormes com os governos petistas. Ela conhece a estrutura de poder, pois ela o pensou e o edificou.
O que acontece é que os donos do poder já não podiam aceitar que mesmo as migalhas que caíam da sua farta mesa fossem atiradas para a base da pirâmide. A crise estrutural do capital exige que se ampliem a exploração dos trabalhadores e que mesmo o frágil pacto social montado após a ditadura e que permitiu um sopro de direitos sociais para os trabalhadores e o conjunto da população brasileira.
Em 2017, o governo Temer foi derrotado pelos trabalhadores e não conseguiu implementar a agenda de deformas que a burguesia o incumbiu de aprovar. Era preciso minar a resistência e a organização dos trabalhadores. Isso justifica o apoio ao fascismo.
Tal como na Itália e na Alemanha no entre guerras, o neofascismo vai buscar arrasar os sindicatos e as centrais sindicais, minando a organização da classe trabalhadora. Combater o fascismo vai demandar unidade de todos os lutadores. é uma luta de vida e morte, pois uma vez liquidados os sindicatos, vão ser tratorados os direitos.
Criar o medo do comunismo e identificá-lo com os que se organizam para lutar. Criminalizar a esquerda pela corrupção crônica do sistema. Some-se isso ao exacerbamento do individualismo, o culto ao empreendedorismo, a propaganda neoliberal que identifica o estado e os direitos com os males e o mercado como a solução de tudo, em meio a uma classe média eu se ressente de não conseguir mais se diferenciar da massa de trabalhadores, da qual sempre se acreditou separada, e temos o ambiente propício para que o pulule o neofascismo.
Mas estamos aqui. A existência de camaradas que continuam escrevendo, questionando, reunindo, entre outras atividades, mostra que a organização da classe vai continuar. 2019 vai ser de muita luta!

terça-feira, 23 de outubro de 2018

O espírito de nossos tempos ou verde-amarelo manchado de sangue

Existe um povo que a bandeira empresta
P'ra cobrir tanta infâmia e cobardia!...
E deixa-a transformar-se nessa festa
Em manto impuro de bacante fria!...
Meu Deus! meu Deus! mas que bandeira é esta,
Que impudente na gávea tripudia?
Silêncio. Musa... chora, e chora tanto
Que o pavilhão se lave no teu pranto! ...
Auriverde pendão de minha terra,
Que a brisa do Brasil beija e balança,
Estandarte que a luz do sol encerra
E as promessas divinas da esperança...
Tu que, da liberdade após a guerra,
Foste hasteado dos heróis na lança
Antes te houvessem roto na batalha,
Que servires a um povo de mortalha!...
(Castro Alves, Navio Negreiro)

Nossa bandeira jamais será vermelha!
Gritou o cidadão de bem que espanca a esposa e os filhos.
Nossa bandeira jamais será vermelha!
Bradou a socialite que não assina a carteira de trabalho da empregada.
Nossa bandeira jamais será vermelha!
Exclamou o badboy que espanca LGBT's.
Nossa bandeira jamais será vermelha.
Disse o empresário sonegador de impostos.
Nossa bandeira jamais será vermelha.
Vociferava o racista, espumando de ódio.
Nossa bandeira jamais será vermelha.
Concordou o latifundiário que toma as terras de indígenas e explora camponeses.
Nossa bandeira jamais será vermelha.
Entre risos, se cumprimentavam banqueiros e especuladores da bolsa.
Nossa bandeira jamais será vermelha!
Esbravejou do altar para o templo lotado e para milhares de casa pelo sina de TV, o mercador da Fé, o lobo travestido de ovelha, a lucrar com a religiosidade de nosso povo.
Nossa bandeira jamais será vermelha.
Em uníssono clamam as vozes do atraso.
E muita gente, muita mesmo, concordou, sem saber, que, o que querem os vermelhos não é mudar as cores de uma bandeira, mas mudar esse país. Torná-lo verdadeiramente de todos, porque durante toda a sua história, ele tem sido de uns poucos.
Queremos a bandeira verde-amarela, com seu círculo mostrando o belo céu de nossa terra, mantendo até mesmo a frase, que ali, nos lembra, o tipo de gente que sempre esteve no comando... Porque, não devemos esquecer a história que nos construiu.... Queremos que ela permaneça como está, mas não a queremos mas, suja, manchada, aviltada pela exploração do homem pelo homem, pela violência que vitima a cada dia as pessoas, apenas por serem diferentes.
Queremos uma nação que estenda as mãos aos irmãos da América Latina e que trilhe seus caminhos, sem a tutela de qualquer imperialismo, seja o ianque, seja qualquer outro. Um país, onde todos possam ter oportunidades, e que possamos ser mais iguais, de verdade. Queremos creches e escolas para nossas crianças e universidades para nossos jovens, queremos saúde, segurança e acima de tudo liberdade para ser o que quisermos.
Queremos negar esse exacerbado individualismo, que só nos permite enxergar o outro como concorrente e permitir que possamos nos assumir, enquanto coletividades, onde eu possa ver o outro como parceiro, para possibilitar que cresçamos todos juntos.
Dito isto, não precisa temer pela cor da bandeira. Precisa temer, sim a desigualdade, o ódio, o preconceito e todos os males que hoje andam a solta e que procuram se esconder, sob a auriverde bandeira brasileira.
Comecei reproduzindo um trecho do poema Navio Negreiro de Castro Alves. Não posso deixar de pensar nessas linhas quando vejo os gritos de que a bandeira não será vermelha. Como diz Alves, infelizmente, nossa bandeira ainda é usada como mortalha dos pobres e oprimidos, das mulheres e das LGBT's, dos negros, enfim de todo nós, trabalhadores.



quinta-feira, 28 de junho de 2018

Para sindicatos de luta: atuação política é fundamental

Qual o objetivo dos trabalhadores ao se organizarem em sindicatos? O principal é unificar seus companheiros para reivindicação econômica. Salário, diminuição da jornada de trabalho eram as principais demandas que levavam a busca pela organização sindical, em seus promórdios.  Melhores condições de vida e trabalho, a luta contra o assédio e outras mais foram sendo agregadas, viraram bandeiras importantes e seguimos lutando.
Além dessas lutas o sindicato, em um país onde muitos direitos dos trabalhadores não saiam da letra da lei, passou a operar como uma verdadeira associação de trabalhadores, promovendo atividades lúdicas, esportivas e outras com o fim de ofertar aos filiados serviços de qualidade, agregando mais e mais membros da categoria às atividades sindicais. No entanto, para muitos sindicatos, o que devia ser um acessório acabou por se constituir na principal razão de ser da organização.
A burocratização da instituição, resultante de sua legalização, com a consequente ampliação dos rendimentos, acabou por tornar muitos sindicatos brasileiros alvo de grupos que pouco ou nada faziam em relação as mais contundentes lutas que se travavam pelo país. Até a patronal chegou a financiar e apoiar grupos com o objetivo de ter sob seu tacão o órgão de representação e organização disponível aos trabalhadores. 
Essa perda do caráter  sindical de reivindicação, de luta incansável, acabou por acomodar a base e afastar muitas organizações sindicais do caminho das lutas. Faz-se necessário, portanto, trilhar o caminho de volta. É preciso que os sindicatos voltem a ser instituições perigosas, cujas ideias que circulam neles provoquem calafrios nos donos do poder e é preciso que, apesar da realização das funções burocráticas, das atividades recreativas e lúdicas para os sindicalizados, o sindicato encampe as lutas e os debates que tragam de volta o temor dos patrões voltem às organizações classistas dos trabalhadores.
Em nossa sociedade tudo gira em torno de ideologias, tornando impossível dirigir ou atuar em um sindicato sem ideologia alguma. Dizer que faz isso é um engano pueril, ou pior, má-fé para com os trabalhadores. Até sua negação da ideologia é uma ideologia, meu amiguinho isentão, aliás, a pior e a mais nociva dela. É preciso utilizar os ganhos de experiência que o movimento dos trabalhadores acumulou até aqui e repassá-los a nova geração. Dar esse suporte aos novos lutadores com o melhor que nossa classe conseguiu e, a partir daí, concluir a formação dos mesmos nas ruas, nas lutas, que é onde se conforma a têmpera dos que não aceitam o atual estado de coisas e querem transformar a sociedade, dando um fim à opressão e à desigualdade. 
Para isso é preciso reforçar a formação política das bases e das direções, pois o aprofundamentos da crise conjuntural do capital  aguça os ataques à classe trabalhadora. Por quê? Simplesmente porque a cada vez que se amplia as contradições do sistema capitalista, toda reivindicação dos trabalhadores, por mais simples que seja se reveste de uma importância política incomensuravelmente maior do que seu impacto econômico. Isso resulta do fato de que, essa reivindicação, mínima, vai de encontro à lógica de poder do capitalismo, impede a apropriação e a reprodução da mais-valia em escalas cada vez maiores.
Compreender esse movimento geral pode nos abrir os olhos para a complexa engrenagem, que de uma ponta a outra do sistema precariza o trabalho e nos lança, a nós, a classe produtiva, na mais ignominiosa indigência. Assim, o trabalhador será capaz de relacionar os ataques que sofre diariamente no seu local de trabalho, com os ataques mais gerais sofridos por toda a classe. Ele vai avançar de uma perspectiva individualista, para uma coletiva, identificando-se enquanto classe trabalhadora, sob ataque em todos os locais de trabalho, sejam fábricas, sejam escolas, sejam repartições públicas, sejam escritórios. Impõe-se as direções sindicais que se desejam novas a necessidade de se fazer esse trabalho de formação, um trabalho hercúleo, mas que ao fim trará frutos, pois preparará os trabalhadores para o futuro levante que  esmagará de uma vez por todas a exploração do homem pelo homem!
Assim, não podemos permitir que nossos sindicatos assumam um papel que deveria ser do governo, ou seja, não devemos assumir os custos com saúde, educação, e outros direitos, devemos cobrar que os mesmos sejam bancados pelos patrões e pelos seus representantes no governo!
Não se trata aqui de negar todo e qualquer auxílio que o sindicato possa dar à sua base, nada disso. Mas se trata de fazer retornar ao topo das prioridades do sindicato o que é mais importante: a sua atuação política, retornar ao seu posto de instituição eminentemente política! É construir em cada sindicato a resistência. 

segunda-feira, 18 de junho de 2018

Lados

História não é uma ciência exata.
Sociologia não é uma ciência exata.
Economia não é uma ciência exata.
Administração não é uma ciência exata.
Assim, muito do que é discutido nelas vai ter uma influência muito grande da forma como você vê o mundo. Vai ser influenciado pelos filtros com os quais você foi dotado durante toda a sua vida, para perceber o que está ao seu redor. Em outras palavras, elas caminham de acordo com uma ideologia. Assim, administradores e economistas são geralmente sujeitos engajados. Uso aqui o termo engajado sem juízo de valor.  Afinal, o sujeito pode estar engajado à direita e à esquerda. Temos hoje, brasileiros engajados pela libertação de Lula, bem como há os que estão engajados em eleger Bolsonaro. Sem juízos de valor, por favor.
O fato que quero ilustrar aqui é que muitas vezes temos sido apresentados, quase sempre pela mídia, para teorias e observações econômico financeiras que nos são apresentadas como UFCF - única forma correta de fazer. O engraçado é que esta forma correta de fazer, muitas vezes é a do grande capital, a do mercado, das grandes corporações financeiras. Há um predomínio de uma lógica que permite a perpetuação da desigualdade e das diferenças sociais, tão profundas na sociedade brasileira.
Esquerda, direita, centro, vermelhos, verdes, anarquistas, enfim, todos os espectros políticos mantém suas posições em torno do que consideram básicas. Criação de valor, distribuição do mesmo, políticas cambiais, gestão da produção, cada uma dessas coisas pode ser vista de acordo com um ponto de vista.
E, infelizmente ou felizmente, digo aos amigos que teimam em permanecer em cima do muro, é preciso escolher um lado. Como disse o Nazareno não há como servir a dois senhores. Estamos aqui para tomar partido. E decididamente precisamos ficar ao lado dos trabalhadores, dos explorados, dos oprimidos, precisamos ficar do lado dos que resistem às pressões do capital, porque do lado de lá, nada há,
para os que aqui já não têm nada!

terça-feira, 12 de junho de 2018

O crescimento da direita e a necessidade combatê-la

Presenciamos um aumento das posições de direita no Brasil. Creio que, na verdade elas estão voltando a mostrar-se depois da ditadura. Trinta anos foi tempo suficiente para esquecer as atrocidades e barbáries cometidas pelos militares (haja vista a quantidade enorme de "gente de bem" vestida de verde amarelo, que ocupa as ruas e praças pedindo uma intervenção militar), quanto mais para esquecer o papel da direita e de suas ideias na preparação do golpe de 1964 e na consolidação do regime.
Antes limitados ao jogo eleitoral, a direita não disputava narrativas e nem fazia o embate ideológico, o que por muito tempo permitiu que posições mais a esquerda dominassem o debate na academia, nos sindicatos, enfim, nos movimentos organizados da sociedade. A direita limitava-se ao uso do poder econômico para angariar votos e continuar como manda-chuva do Estado. Uma parte dela, cedendo a pressões dos trabalhadores fez concessões que resultaram em um nível mínimo de proteção ao trabalhador.
Mas as coisas começaram a mudar na última década. A crise do Capital iniciada nos países centrais em 2007, trouxe duas consequências: o repasse da crise para os países periféricos e o recrudescimento da escola neo-liberal. Economistas europeus e norte-americanos jogaram nas costas do Estado a culpa por uma crise dos mercados, que se teve alguma influência estatal foi a falta de regulamentação. Esses economistas passaram a pregar a respeito de austeridade, como forma de sair da crise, e ao dizerem austeridade queriam dizer que o Estado deveria desobrigar-se das políticas de bem estar-social e cuidar apenas de uma ambiente que fosse saudável para os mercados, como diz Dardot e Laval, em seu livro sobre o neoliberalismo, não é menos Estado, mas um Estado mais voltado para as demandas do Mercado.
Ora, para a elite brasileira, que nunca quis realmente sepultar as senzalas e promover a igualdade no país, essa tal de austeridade era música para seus ouvidos. Que importa destruir o país, entregá-lo nas mãos dos especuladores internacionais? Desde que eu garantisse meu cordão de isolamento sanitário para com o restante do povão, valia tudo!
Não nos esqueçamos que, no Brasil, durante o Império, o liberalismo chegou aqui, e foi muito bem abrigado nas casacas dos barões de café. O Visconde de Cairu, propagador das ideias de Smith, conseguiu em sua obra adaptar o livre mercado à escravidão. Após a república, tivemos décadas de liberalismo, que considerava que o dever dos brasileiros era fornecer produtos agrícolas aos países do Norte, enquanto recebia destes produtos industrializados. Enquanto vicejou a política liberal no país, esta se apoiou no atraso político e econômico. Por que seria diferente em sua nova roupagem?
Assim, grupos de estudo se espalharam como um vírus por todo o país. Ocuparam espaços na mídia, realizaram debates e criaram uma narrativa simplista em que culpavam o Estado e os impostos pela crise. A uma multidão ávida por respostas forneceram a resposta errada. Mas note-se, para cada fala ilustrada e pontuada por citações da Escola austríaca, de Friedman e de outros Chicagos boys, ouvia-se ainda mais discursos de ódio, taxando de vagabundos qualquer membro das classes baixas por receberem auxílios do governo, xingamentos preconceituosos com os cotistas, dizendo ser tratamento desigual, uma reparação histórica que deveria ter sido feita a décadas, multiplicando as perseguições aos LGBT e a todos os oprimidos.
Então, tal como nos tempos de Cairu, conseguem inacreditavelmente separar as pautas do liberalismo e vemos aqui liberais contra o aborto, contra a descriminalização das drogas, liberais que orgulhosamente se intitulam de liberais na economia e conservadores nos costumes. Há algo muito errado com essa gente. Aliado a isto, o fascismo também viceja. Procura desvincular-se do passado, falseando a história com balelas como "nazismo é de esquerda", mas a truculência, o racismo, o machismo e a LGBTfobia estão lá.
É preciso detê-los. Organizar as defesas e retomar o embate. Precisamos ganhar as batalhas das narrativas. Mostrar que o Estado mínimo é ainda mais prejudicial, para os trabalhadores e que com este Estado só quem ganha são os ricos e poderosos, os banqueiros e industriais. É preciso reafirmar que só há uma crítica possível ao estado de coisas  que enfrentamos no mundo e esta, só pode ser feita pela classe trabalhadora. A saída é pela esquerda.
O momento é de acúmulo de forças, uma vez que estamos diante de uma ofensiva da burguesia. Mas não podemos deixar que disputem nossos espaços. Não podemos deixar que conquistem as manifestações, as greves, os sindicatos, os DCE's e CA's. Não podemos deixar que contaminem os movimentos sociais. Um outro mundo é possível e este é o oposto do que eles querem.
A retirada de direitos, a precarização dos trabalho, o aumento do assassinato dos jovens negros da periferia, as agressões às mulheres, na rua, no trabalho, no lar e os atentados contra os LGBT's tem que cessar. E só poderá cessar se nós, trabalhadores fizermos isso. Precisamos organizar a RESISTÊNCIA.

segunda-feira, 11 de junho de 2018

Mudança, mudanças

Chapéus eram parte indispensável da vestimenta. Hoje não se veem mais tantos por aí. Os tempos, em uma voragem insaciável consomem costumes, modas, palavras, línguas, povos inteiros e mesmo deuses.
Há pouco mais de um século, aqui no Brasil, éramos uma monarquia, tínhamos escravos, a Igreja Católica era a oficial do Estado e as demais toleradas, sendo que as religiões afro eram duramente perseguidas e marginalizadas. Hoje, somos uma república, a escravidão foi substituída pela opressão do proletariado aos ditames dos senhores do Capital, Estado e Igreja se separaram, o que permite que igrejinhas de todos os matizes pululem como ervas daninhas entre os muros de nossas periferias, somos o o maior país em número de espíritas do mundo e, as religiões afro, embora vítimas de preconceito como tudo o que é negro, são reconhecidas como parte da nossa cultura.
Tudo isso mostra o quanto somos passíveis de mudança. Aliás, é até redundante dizer, mas a mudança parece ser a única coisa constante nas vidas dos seres humanos. Talvez por isso tantos a temam. Por isso, muitos queiram impedir que a roda do tempo, em seu girar, despedace o velho dando lugar ao novo.
Mudança exige adaptação. Algo que não é fácil pra ninguém. Adaptar pede sair da zona de conforto, abandonar convicções e refazer até certo ponto suas próprias formas de ver o mundo. Não é fácil. Muitas vezes não é prazeroso. Mas é necessário. Adaptemo-nos, mudemo-nos. Recebamos o novo de braços abertos, pois ele virá, não importa que você não queira ou não goste.

quarta-feira, 6 de junho de 2018

À sombra da moringa: café, conversas e mais

Quem conhece a UFCA, conhece a moringa que fica entre os blocos azul e rosa. Ela fornece uma sombra aprazível entre esses dois blocos praticamente o dia todo. E no Cariri, uma sombra é tesouro em meio ao sol abrasador que todos os dias banha a nossa terra. Pois bem, ali, aquele local, acabou por tornar-se ponto de encontro da comunidade acadêmica. Ali a galera se reúne pra bater papo, fumar um cigarro, desacelerar um pouco.
A moringa acabou por tornar-se um símbolo daquilo que uma universidade deve ser: plural, aberta ao diálogo, local de compartilhamento de saberes e de experiências. Ali sob sua copa, já foram realizadas assembleias de estudantes, aulas e muitos outros eventos.
Chegando no campus de Juazeiro do Norte, vindo do Campus de Icó, o primeiro contato que tive com os novos colegas de trabalho foi embaixo da moringa. Um espaço que aos poucos fui tornando meu, não no sentido de posse, mas no sentido de identificação, de lugar para ficar a vontade para expressar, sejam ideias, sejam descontrações.
Todas as manhãs, a moringa é o point onde nos encontramos para o cafezinho e para conversar... A moringa acabou se tornando para o nosso grupo, nossa versão caririense dos cafés de Paris, onde o café é uma simples desculpa para falar sobre economia, política, cultura e da nossa Universidade Federal do Cariri.
E esta universidade é alvo constante de nossas conversas, pois acreditamos em uma concepção de universidade emancipadora, que não se venda ao mercado e que tenham como objetivos a resolução das demandas sociais da região. Uma concepção que a cada dia se torna mais difícil de realizar, por conta dos ataques constantes à educação pública, com cortes que praticamente reduzem nossas possibilidades de realizar ensino, pesquisa e extensão. Mas seguimos resistindo. Da moringa já saiu projetos de pesquisa, artigos, trabalhos diversos que buscam dialogar com uma visão crítica da educação e que se coloca contra o neoliberalismo e sua lógica perversa.
Somos poucos, mas queremos ser mais. O debate está aberto e a participação de todos é mais do que necessária. Construir uma universidade inclusiva, pública, gratuita e de qualidade, à serviço dos trabalhadores é uma tarefa de proporções gigantescas, mas não nos furtamos ao debate.
Texto dedicado aos camaradas todos que, sob as sombras da moringa, ousam sonhar.

terça-feira, 5 de junho de 2018

Escolhas, cesta de produtos e liberalismo, ou, porque você não vai aumentar suas vendas se o Estado cortar impostos

Os tempos em que vivemos são tempos de falácias. Nós as temos de todos os tipos e tamanhos.
Algumas são risíveis e logo são desmascaradas. Já outras... são, vamos dizer perigosas. Uma delas
surgiu durante a crise econômica iniciada em 2008. Por essas idas e vindas do pensamento perturbado
de certos economistas, uma crise de mercado passou a ser vendida como uma crise do Estado. A
irresponsabilidade com os ativos de alguns bancos passou a ser creditada a “gastos perdulários” do
Estado. De lá pra cá os liberais repetem como espantosa desfaçatez, hipocritamente esquecendo
seu próprio papel na bolha imobiliária, o velho mantra de que todos estaríamos melhor se o Estado
não fosse tão grande e se deixasse nas mãos do mercado uma boa parte dos serviços que hoje se
ofertam à população.
Primeiro, entendemos que àqueles que realmente têm necessidade desses serviços, por não
poderem pagar por educação, saúde, segurança e previdência privada, não deveriam cair no
canto da sereia liberal. Mas infelizmente muitos têm caído. Como não encantar-se com as
promessas de um paraíso na Terra? Riqueza criada a rodo e disponível a todos? Bom demais
para ser verdade. E não é!
E ainda existe aquela legião de homens e mulheres que escolheram abrir seu próprio negócio e
se tornaram os heróis dos século XXI! Não precisamos de Aquiles, Ulisses, esses gregos todos do
passado, não precisamos de Professor Xavier e de seus alunos mutantes, esqueçam Superman,
Homem Aranha e todo o Panteão de super-heróis da DC e da Marvel. Nenhum deles é páreo para
os portadores de poderes quase que miraculosos: os empreendedores! E o melhor, eles não estão
sozinhos! Contam com seus mestres, ainda mais sábios do que Yoda e cia. Os Coachs! Viramos uma
nação de coachs! Alguns anos atrás e eu simplesmente, se tivesse esquecido minhas aulas de inglês
ao ouvir a palavra coach acharia que a pessoa estava querendo imitar o coachar dos sapos. Agora é
impossível que eu não saiba o que são e o que fazem essa classe especial de pessoas, que
altruisticamente ( e por uma boa quantia) ajuda qualquer uma achegar no Olimpo dos bem
sucedidos em seus negócios próprios surgidos do nada!
Bem para essa galera, seu esforço individual é capaz de tudo. Construíram-se sozinhos. Seus crescimento
nada teve a ver com políticas públicas que expandiram o mercado interno fazendo com que a população
consumisse mais e, por tabela precisasse de mais gente para produzir, vender e prestar os serviços de
que necessitava. Foram incapazes de enxergar o quanto o Estado Grande de que hoje tanto reclamam
os ajudou. Tudo o que fizeram conseguiram com o seu esforço. O engraçado é que agora, esses esforço
não é suficiente. E magicamente, descobriram que a culpa é do Estado. Incapazes de ver o quanto foram
beneficiados pelas políticas que agora combatem, são também incapazes de ver que se o mérito era
todo deles e que o Estado só atrapalha, porque não continuaram em sua trajetória ascendente?
Deixemos aqui reticências diante dessa contradição que eles não saberão responder...
Bem, continuemos. Os liberais e os empreendedores, que pelo facebook, youtube e blogs dos mais
estéreis pântanos da web, aprenderam tudo o que deviam saber e mais um pouco sobre economia,
afirmam que a diminuição de Impostos vai trazer a todos mais oportunidades, porque o dinheiro vai
deixar de ser “roubado” pelo Estado e ficará nas mãos dos cidadãos, que saberão melhor o que fazer
com ele. Mais homo economicus, impossível. A ideia falida de que as escolhas econômicas do indivíduo
são sempre racionais visando a maximizar a utilidade de seu consumo já foi descartada a muito tempo
pelos avanços da psicologia, da economia comportamental, da administração e de outras ciências.
Mas o que importa? Para os defensores do Estado Mínimo basta que cheire a científico, para que como
urubus, ao redor da carniça, eles comecem a brandir qualquer argumento.
Façamos um exercício de imaginação. Cortemos os impostos, diminuamos o Estado. Como bons liberais,
os defensores do Estado Mínimo não deixarão os investidores na mão. A dívida e seus juros estão
garantidos. Mas com o corte de impostos, e sem mexer nos pagamentos de juros, o que vai ser cortado?
Ora, a educação, a saúde, a segurança e outros serviços que podem, reza a cartilha liberal, serem
ofertados com mais qualidade e efetividade pela iniciativa privada.
Empreendedor, você estará no melhor dos mundos! Seus impostos caíram a quase nada! Mas... algo
está errado. As pessoas compram menos ou até pararam de comprar. O que está havendo? Não há
mais o peso do desengonçado elefante do Estado sobre as costas do país. Porque não gastam o dinheiro
que deixou de ser roubado pelo governo?
Ora meu amiguinho, o mundo é bem mais complexo do que o modelo da Terra Plana que você viu
no Youtube! Com o Estado Mínimo, o governo deixou salários seguirem a lei da Oferta e da Procura.
Negociação direta entre patrões e empregados... Um exército de reserva enorme a procura de emprego,
que sem ter salários regulados são rebaixados ao mínimo possível no qual alguém esteja disposto a
executar.
Em muitas cidades, o fim das aposentadorias e de seus reajustes levaram a uma diminuição do consumo,
uma vez que era dos aposentados a renda principal de muitos municípios. Você vê com espanto suas
mercadorias continuarem nas prateleiras.
Mas, ainda há pessoas empregadas e que poderiam comprar, restabelecendo o círculo virtuoso do
crescimento. Você se engana. Mesmo que os salários não tivessem caído, o consumo diminuiria.
Por um motivo simples: Cada pessoa usa seu dinheiro para comprar uma cesta de produtos. Ele
equilibra essas cestas de acordo com o aumento ou diminuição dos preços. Consome um pouco
mais de uma coisa, substituindo por outra.
Com o fim da oferta de educação, saúde, segurança e previdência pelo Estado, a
pessoa ainda terá necessidade de tudo isso. Resultado: Ele terá de reservar espaço na sua
cesta para esses serviços. Ficará bem menos para consumir as outras coisas. Você, amigo
empreendedor, em pouco tempo não terá como se manter no mercado. Nesse cenário, apenas
alguns poucos permanecem, geralmente os grandes do setor. Você vai retornar a um mercado
desregulado, sem nenhuma proteção. Boa sorte e saudações liberais.

Na vida real, nada é simples. Tenha cuidado com o que deseja. A saída da crise é pela esquerda.

quarta-feira, 23 de maio de 2018

Uma Justa homenagem: Auditórios da UFCA recebem o nome da Beata Maria do Araújo e de Bárbara de Alencar

Auditório Beata Maria de Araújo
    Esta semana fomos surpreendidos positivamente pela divulgação dos nomes dos auditórios da UFCA. Fruto de um processo democrático, tanto na proposição dos nomes, quanto na escolha dos mesmos por meio de Consulta Pública, a escolha do nome de duas mulheres fortes, figuras marcantes da história do Cariri. O miniauditório, na sala 89 no bloco E recebeu o nome de Bárbara de Alencar, revolucionária, a primeira presa política brasileira, por sua atuação contra os desmandos e o absolutismo monárquicos.
A Auditório do Bloco H, ou o Novo auditório, como era mais conhecido, ou ainda o auditório grande recebeu o nome de Beata Maria do Araújo, a protagonista do milagre da hóstia, que diferente do Pe. Cícero, foi legada ao esquecimento, por ser uma mulher negra, pobre, do interior do Nordeste, que ousou contrariar os interesses das hierarquias religiosas de sua época ao afirmar sua comunhão com o divino por fora das normas da igreja.
Duas mulheres, duas “transgressoras” da ordem constituída, homenageadas em uma instituição de Ensino Superior, que precisa desesperadamente, nesses dias
TEMERosos, ser também transgressora se desejar continuar a realizar a inclusão social e o desenvolvimento sustentável em um território, como o semiárido cearense, que durante anos foi legado ao esquecimento pelos formuladores de políticas públicas.
Auditório Bárbara de Alencar
Que o nome dessas duas mulheres possa inspirar formas de resistência a cada camarada participante da comunidade acadêmica, seja professor, técnico, terceirizado ou estudante.
Bárbara de Alencar, Maria de Araújo, Marielle e outras mulheres que ousaram não se alinhar, estarão sempre presentes! Continuemos lutando por mais igualdade, por mais justiça social e por mais educação superior pública gratuita e de qualidade para o povo trabalhador do Brasil!

sexta-feira, 4 de maio de 2018

Os caminhos que nos trouxeram aqui ou porque todo mundo devia saber um pouco sobre Custo de Oportunidades

Ano passado, quando fui assistir Lalaland nos cinemas, achei que tinha entrado em uma roubada, tipo, estou indo assistir um indicado ao oscar, que deve ser só mais um enorme romance piegas. Fui surpreendido. Desde a monumental abertura, até o final, tão pouco convencional em uma produção norte-americana.
Muitos amigos execravam o filme pelo fato dos protagonistas não terem ficado juntos. Mas, ali, naquilo que eles viam o pecado do filme eu via a sua maior virtude. Ambos realizaram seus sonhos, uma tornou-se a atriz famosa que sempre sonhara, o outro conseguiu abrir o bar pelo qual batalhara a vida toda! Em um mundo em que os sonhos não passam de fantasias, eles realizaram os seus. Mas isso teve um custo. Um custo que, a julgar pelo sorriso de ambos eles julgaram adequado. O custo foi o de perderem um ao outro.
A sequencia que mostra como teria sido a vida de ambos se não tivessem aberto a mão um do outro é um exercício de imaginação criativa que devia ser feito por todos nós! Como seria nossa vida se tivéssemos tomado uma outra atitude? E mais, valeu a pena? A decisão que tomamos e que moldou nossa vida e nos trouxe até aqui foi a mais acertada?
Em administração nos temos um conceito que chamamos de custo de oportunidade. Já ouviu falar? Trocando em miúdos e deixando bem simples, o custo de oportunidade é um benefício perdido por causa de uma determinada escolha. Pra deixar mais claro, vamos com um exemplo simples: você vai ao cinema: em cartaz dezenas de filmes, com posteres atraentes, críticas positivas  e por aí vai. Podes assistir apenas um. Você escolhe assistir, sei lá, uma comédia francesa, porque você quer fugir dos enlatados americanos. Todos os demais filmes que você deixou de ver integram o seu custo de oportunidade. Emoções, sensações, alegria ou tristeza, prazer ou dor, você deixou de ter ao escolher assistir o seu filme.
Como o exemplo acima, assim é tudo o que fazemos na vida. Abrimos mãos de certas coisas por outras a todo instante. O problema é que muitas vezes fazemos isso sem nos dar conta do que estamos perdendo. É impossível que tenhamos tudo o queremos. Não dá pra desfrutar de todas as coisas boas e nem evitar que certas dificuldades nos encontrem. Mas precisamos raciocinar sobre nossas escolhas e minorar as perdas. Não podemos simplesmente nos entregar ao acaso, jogar a moedinha pra cima e torcer pra que ela caia com a face boa voltada pra gente.
Conheci minha esposa em uma noite de Natal. No dia seguinte tivemos nosso primeiro encontro. Um jantar. Dois desconhecidos, sem praticamente nada em comum a não ser uns poucos conhecidos, jantando em um rodízio de massas em uma noite quente de dezembro. Não parecia muito promissor. E o que nos salvou? Passamos a noite falando sobre custo de oportunidades! Ela encantou-se com a ferramenta. E posso dizer que a concepção da mesma é tão interessante que serviu de mote pra muitas conversas depois disso. E posso dizer que, analisando os custo de oportunidades, fizemos, ambos, uma boa escolha.
Mas voltando ao assunto, acredito ser necessário que todos possam conhecer um pouquinho que seja sobre o assunto. Ajuda muito. Nos negócios, nos romances, na vida. Da próxima vez que estiver diante de uma escolha, procure pensar um pouco sobre o que vai perder ao abrir mão de cada opção
que estiver diante de você.


terça-feira, 1 de maio de 2018

Sobre o prédio do largo Paissandu: a especulação imobiliária destruindo vidas na maior cidade do país

Notícias do desabamento do edifício ocupado por sem tetos no Centro de São Paulo enchem as redes sociais. Suspeitas de incêndio criminoso. Mortos, feridos e desabrigados. O vai e vem de políticos buscando angariar simpatia e os holofotes da mídia, que como abutres buscam a imagem perfeita, mas não o âmago da história: a saber a brutal desigualdade que deixa milhares de famílias sem local para morar tendo que se virar debaixo de viadutos, em parques, praças, sob sol e chuva. Parece que dignidade é algo que só pode ser desfrutado por uns, enquanto outros devem silenciar enquanto lhe são retirados direitos e até mesmo a própria humanidade.
Independente de o incêndio ter sido ou não criminoso, existe sim um responsável, ou mais de um: a especulação imobiliária, pela qual, um prédio se deteriora e fica sem condições de habitação, simplesmente para que possam colher lucros com ele. A omissão do poder público, que permite que os especuladores deem as cartas e o sistema capitalista que deseja transformar tudo e a todos em mercadoria e fazer das relações humanas simples acessórios para as relações comerciais.
Reduzir tudo aos frios números dos lançamentos contábeis é uma forma de retirar nossa humanidade. Essa logica que nos escraviza, não deseja que vejamos, nos demais oprimidos, nossos irmãos.
Precisamos identificar quem são os nossos inimigos e estender as mãos aos demais explorados por essa sociedade para que lado a lado possamos não apenas combater, mas vencer a burguesia e seus aliados.
Choremos nossa dor pelos que tombaram, sempre! Recordemos deles e nos esforcemos para os soluços de tristeza possam se tornar os brados de revolta que marcarão a retomada das lutas dos trabalhadores e de todos os oprimidos!
Paz entre nós, guerra aos senhores!

segunda-feira, 12 de março de 2018

Fica bem, Benfica

Desde a sexta-feira que me sentava a frente do computador para escrever sobre o Benfica e não conseguia. Por quê? Porque o Benfica é um bairro de Fortaleza que chega a ser mitológico! Lugar onde se conjuga lazer, diversão, esporte e educação em uma cidade tão carente de espaços para a juventude.
Comecei a frequentar o Benfica ainda criança. Para ver os jogos de futebol no PV. Adolescente, estudante da antiga Escola Técnica, hoje IFCE, o bairro passou a ser parte da minha rotina diária, de segunda a sexta estudando, nos fins de semana indo para reuniões da minha corrente política. O Benfica nunca saiu de mim, embora eu tenha abandonado os estudos, embora tenha ido morar em outras cidades.
Tempos depois, me reencontro com o Benfica. De volta a Fortaleza, fui aluno de mestrado da UFC, e sindicalizado junto ao SINTUFCE, cuja sede fica ali na praça da Gentilândia. Voltei a ter uma convivência com os dias e as noites do Benfica, com suas instituições de Ensino, com seus restaurantes e barzinhos, com seus moradores de rua, antes de um reencontro com o bairro, foi um reencontro comigo mesmo.
 Talvez por isso tenha sido tão forte a sensação de perda que eu tive quando soube da chacina. Quando soube que o sangue da juventude voltava a ser derramado de novo em um ato violento, dessa vez não em uma periferia, mas num bairro tão cheio de significados, acredito, para todos nós que vivemos em Fortaleza.
A falida política de segurança pública, que desde meados do século XXI consiste em aumentar a repressão com mais e mais PMs nas ruas, construir mais presídios e cadeias, mostrou-se de novo ineficiente. A cada mês, Fortaleza é pontilhada por chacinas, que não incomodavam tanto a elite, enquanto se concentravam nas periferias. Extermínio da juventude pobre e preta pela polícia e pelo crime organizado nas periferias, não comove.
Atingir o coração da classe média de Fortaleza é um escândalo! Notas são escritas na mesma velocidade das balas que mataram os jovens, a revolta se estende por todos os lados... muitos, só agora veem que a violência na cidade está fora de controle.
Há tempos que o Benfica tem sido alvo da ação de criminosos. Criminosos, que não precisam ter armas nas mãos para assaltar, matar e destruir, criminosos que, se aproveitando da democracia burguesa, elegeram-se para destruir a educação, a saúde e o lazer do povo pobre brasileiro. Criminosos que escondidos sob o capuz do nacionalismo, cultuam as suásticas e espalham o ódio. Chega! Nós, trabalhadores e trabalhadoras, a juventude não vamos desistir de nossos espaços! O Benfica é educação, o Benfica é cultura e principalmente RESISTÊNCIA!
A elite criminaliza a juventude pobre quando ela não se mantém nos espaços que lhe determinaram. A elite deseja que o trabalhador seja invisível. Ela quer manter os espaços da cidade separados, não permite que tenhamos, diversão, lazer, cultura e educação. Mas a violência está uniformizando-os. Batendo a sua porta. As contradições do capital se avolumam nessa cidade desigual e o resultado é o extermínio do povo pobre, do povo preto, dos trabalhadores. Já passou da hora de acabar com isso!
Se o capitalismo é incapaz de satisfazer as reivindicações que surgem infalivelmente dos males que ele mesmo engendrou, então que morra! (TROSTKY)

quinta-feira, 8 de março de 2018

Nada a perder



Proletário a penar,
Com teu suor, sangue e
Tristes lágrimas, d'outro
A riqueza, constrói,
Sem deixar de sonhar
No possuir seus louros

Palácios suntuosos
Ele ergue enquanto corre
Vive, sofre, tem filhos
E finalmente, morre
Em míseros casebres
Dos locais populosos

Rezando a um Deus que nem
Conhece, segue crendo,
Na aguardada mudança,
Espera, não perdendo,
As caras esperanças
Que o tempo melhor vem

Precisas entender,
Nada tens a perder,
Se tua cabeça erguer,
Sacudir de si o jugo
E fazer desse mundo
Mesmo seu paraíso

segunda-feira, 19 de fevereiro de 2018

Uma grata surpresa: A forma da água

Já no apagar das luzes do carnaval, dei um pulinho no cinema. Assisti ao belíssimo A forma da Água. E posso dizer que Guillermo del Toro, mais uma vez conseguiu surpreender com um filme tocante e singelo, que aborda uma série de neuras e psicoses de nossa sociedade.
Às vezes nada é mais clichê que a insistência hollywoodiana da luta entre o bem e o mal e entre a bem demarcada fronteira entre bandidos e mocinhos. Neste filme também encontramos isso: o violão é vil e torpe e não temos como nos identificar com ele. E os que se colocam do lado do bem são cheios de virtudes, apesar de seus medos, fraquezas e deficiências.
Quando as luzes foram acesas e pudemos nos dirigir de volta ao nosso mundinho real, tão diferente daquele que contemplamos na tela grande, começamos, eu e minha parceira, a pensar no que esse filme, de roteiro tão simples, nos trouxe para refletir. E foi uma reflexão que revelou uma coisa: monstros existem... e não são assim tão diferentes fisicamente de mim ou de você... os maiores monstros não são aquelas deformidades que nos acostumamos a imaginar, baseado nas histórias que ouvimos quando crianças, nas lendas que nos contam nas escolas, ou apresentados a nós nos gibis baratos... os verdadeiros monstros estão a espreita, dentro de nós mesmos. Esses devem ser combatidos, de verdade, porque os estragos que costumam fazer são bem reais.
Assistam A forma da água, tirem as suas próprias conclusões. Divirtam-se e deleitem-se com a trilha sonora maravilhosa e mergulhem no clima dos EUA dos anos 50, da guerra fria e não deixem de observar que para a empatia e mesmo o exercício da alteridade são necessários para sermos humanos!

quarta-feira, 14 de fevereiro de 2018

Leitura do carnaval: O gato e outras histórias, de Edgar Allan Poe

Carnaval chegando ao fim. Quarta-feira de cinzas. Cinzas. Pra muitos que desde sexta estão pelo mundo, hoje é dia de cinzas, Literalmente. Pra mim que fiquei no sossego do lar é só mais um dia de zapear canais em busca de algo interessante ou de folhear um livro ou outro.
Ora minha sorte, folheei a pequena brochura do Poe.  Fazia tempo que eu não lia algo dele e assim foi um reencontro sabe?
Três textos são muito bons: O poema "O corvo", e os contos " A máscara da morte vermelha" e "os assassinatos da rua Morgue". São três exemplos da versatilidade do autor e prendem a sua atenção, pois te fazem ansiar sempre pelo próximo passo, pelo que irá acontecer.
Vamos do último, ao primeiro. No conto sobre os assassinatos somos apresentados a Dupin! Um cavalheiro francês que serviu de inspiração para o Holmes de Conan Doyle. Seu uso da lógica para descobrir o autor do crime,    e o narrador ser um amigo, que ao final deve manusear a pistola nos faz lembrar muito do distinto detetive londrino. Embora encontremos essas semelhanças, seria muito difícil encontrarmos Holmes e seu fiel Watson em um crime tão sangrento.
Em a máscara da morte vermelha, parecemos ter sido transportado para um conto dos irmãos Grimm. Mas, não nos esqueçamos que nessa jornada, somos conduzidos pela mão do obscuro Poe. E o que temos? Um vívida descrição da Morte Vermelha e de seus sintomas! Ao mesmo tempo que a punição horrenda de uma elite, que abandonara o povo a sua própria sorte, confiante que seu poder e riqueza os salvaria.
Por fim, um poema excelente! E ainda mais sombrio. Parece-me que diante de meus olhos ainda paira o negro corvo e que em emus ouvidos retine a sua voz áspera e inumana, que a cada pergunta do protagonista só responde: Nunca mais!
Estes três coroam um livrinho, recheado de contos como esse, onde o tema do sombrio, da morte e as cinzentas pinceladas da tristeza acabam por levá-lo a refletir sobre uma porção de coisas!
Mas, porque nos deixar levar pelo clima pesado? Estamos chegando ao fim do carnaval. Amanhã, como dizemos, começa o ano! Voltemos à labuta, e lembremo-nos do corvo para dizer aos momentos tristes  de nossa vida: Nunca mais!