quarta-feira, 6 de novembro de 2019

Escritas

Sempre achei que escrever era a coisa mais maravilhosa do mundo. As letras surgindo no papel, direto da ponta do lápis ou da caneta, de formas diversas de acordo com a intenção e a mão de quem escreve sempre me trouxeram o sentimento de presenciar um ritual, na verdade, quando surgiu, escrever era um ritual, algo mágico e que conferia poderes e importância a quem dominasse a arte.
Gosto de escrever, escrever mesmo, não digitar como é tão comum. Aprecio a forma das minhas garatujas tortas. E gosto de escrever sem meta ou rumo, sem objetivo ou intenção. Apenas.vou lançando as ideias que me vem na cabeça, todas, todas no papel. 
Por vezes só eu conhecia o que estava ali. Outras vezes o texto era revisto, reelaborado e reescrito e posto à luz do mundo, ao crivo da opinião de leitores outros. 
Quando comecei a publicar, pequenos contos, historietas que compunha para colocar a andar por aí as personagens que há tempos me rondavam os pensamentos, foi outro momento chave: outras pessoas teriam interesse em acompanhar as pequenas tragédias e comédias que saíam da minha lavra?  Gostarão dos meus heróis, torcerão por eles, como torceram e torcem por Aquiles, por Heitor? Chorarão com a sua dor como choram ante a morte de Jean Valjean ou da de Cyrano?
Por um tempo isso deixou-me preocupado... Mas depois, ah, depois achei melhor ocupar meus pensamentos com outras coisas. Afinal, tenho que terminar outras tantas histórias, escrever outras tantas memórias, criar sei lá mais quantos manifestos e compor nem sei quais notas para este ou aquele movimento aporem sua assinatura.
Escrevo e pronto. Que outros julguem, que outros odeiem e amem o que escrevi isso é com eles. O que a mim importa, entendi, é que os meus textos me deixem satisfeitos!

Assim vou seguindo essa minha vida de autor, escritor, militante, pesquisador e os muitos outros papéis e máscaras que a vida vai me pedindo para usar. Faço uso delas, das máscaras, dos papéis, porque é isso que é o homem: o conjunto daquilo que ele é para os outros e para si mesmo com os sonhos que tem para si. Quando esquecem do que são para si e dos sonhos que projetou, as pessoas não.se reconhecem, se perdem e aí, já viu...
Quem acompanha este blog, deve saber que faço aqui esse exercício de correr os dedos sobre o teclado e depois, dar um enter descuidado, em um texto que talvez nem te agrade, mas a mim, autor, deixa satisfeito!
P.S: em meio ao texto vai o Quixote e o Sancho Pança. Por que? Nem eu sei... Vai ver porque gosto de suas quixotadas ou porque em mim reconheço uma figura com tanto quanto quixotesca...

segunda-feira, 23 de setembro de 2019

Memória, cinema e afins

Faz tempo que assiti pela primeira 1492 - A Conquista do Paraíso, filmão rodado para as comorações dos 500 anos da chegada de Colombo à América. Eu era um adolescente, apaixonado por história e que adorava filmes baseados no passado. Naquela época a cena final me chamou muito a atenção. Nela um Colombo envelhecido e desgastado conversa com seu filho Fernando. Este pede ao navegador que lhe conte tudo o que se lembra das viagens. Colombo diz uma frase: "Eu me lembro" e a fica repetindo, enquanto a câmera foca no papel onde o filho detém suspensa a pena embebida na tinta, que pinga sobre o papel.
Ali, no fim de um filme, que anos depois tive de rever com outros olhos, para entender a reconstrução que o cinema fazia do descobrimento da América, ali. naquela imagem da tinta pingando sobre os folha de papel eu me dei conta da importância das lembranças, da memória e dos registros da mesma.
De como sabemos de acontecimentos do passado pela opção que alguém teve de guardar e preservar alguns documentos em detrimentos de outros. De privilegiar narrativas enquanto outras eram escondidas ou perdidas para sempre.
É isso. nós estamos sempre mudando. Assim como nossa compreensão do passado. Talvez por isso há quem diga que não há verdade. Mas há. a verdade foi o que ocorreu, com suas motivações, suas contradições e tudo mais. Uma tecitura complexa e que muitas vezes é reduzida por quem escreve sobre ele. Há os que o falseiam. Há os que o observam sob um só ponto de vista. Mas não existem várias verdades. Existe ideologia. Existem ideologias. E estas retratam com suas cores o passado que desejam.
Precisamos compreender isso. E seguir na busca da escrita da história. Usando da memória, dos documentos, enfim do que nós tivermos às mãos. Para compreender que homens fizeram a história, imprimiram sobre ela seus sentimentos, impressões  e desejos. Escrever para responder as perguntas que temos a fazer ao passado, perguntas cujas respostas nos ajudarão a compreender o tempo em que vivemos.

terça-feira, 20 de agosto de 2019

Lágrimas

Tenho visto, desde a vitória do fascismo nas últimas eleições muitos camaradas chorarem. Tenho ouvido muitos relatos de choro. Angústia, medo, desânimo. É uma miríade de gente de todos os tipos, de todas as correntes, de todos os gêneros. A desesperança bateu fundo em muita gente.
Ouço relatos de militantes adoecidos, reclamações sobre militância que adoece. E sempre me mantive solidário, mas eu mesmo não encontrava as lágrimas, mesmo nos momentos mais tristes. Desde o golpe temos muito pouco a comemorar. Direitos sendo retirados diariamente, as condições de trabalho se precarizando até se tornarem aviltantes, as desigualdades sociais e regionais se ampliando, o aumento do ódio e a criminalização dos que lutam foram nossa rotina desde a derrocada de Dilma.
Mas eu não poderia dar a estes senhores, donos do poder e que agora se arvoram senhores do medo, eu não poderia dar a eles o gosto de me ver chorar. Não um orgulho bobo, mas um a forma de resistir. Diante do sádico, permanecer impassível é uma defesa.
Não critico os que choram. Eu os compreendo, Podem ter certeza de que tem o meu respeito, a minha solidariedade e meu ombro amigo. Depois de tudo o que fizemos e o que conseguimos, não dava para imaginar tamanho retrocesso. Tanto não dava que em 2013 milhares saíram às ruas pedindo mais, exigindo que a ascensão a consumidores cedesse espaço à ascensão enquanto cidadãos. Mas algo deu muito errado. 2013 foi o ano em que a direita veio disputar conosco as ruas e, ainda não sabemos como e nem porquê, venceu. Precisamos engolir o impeachment, a reforma trabalhista e o Teto dos Gastos para voltar a realizar grandes mobilizações de rua.
Mas não foi suficiente. Nossa geração, que em 2003 conheceu a vitória nas urnas de um projeto novo, viu esse projeto ser descaracterizado e pior, viu das ruínas dele se erguer a serpente fascista. Os tempos que vivemos são duros. Nenhuma única pauta que possa ser identificada o mínimo possível com a esquerda vai ser deixada de pé por nossos inimigos. Choremos. Mas não deixemos que as lágrimas nos enfraqueçam, pelo contrário, que elas sejam a mistura que falta para uma nova argamassa que fortalece a militância e nos dê forças para os próximos combates.
Ao tomar partido, ao enveredar pelo caminho da luta por transformação social, escolhemos o caminho difícil, sabíamos disso. Mas seguiremos, juntos, porque essa é a força maior que temos, nossa solidariedade de classe.
Cá no Nordeste vivemos em uma terra tão quente quanto o sangue que corre em nossas veias, sangue que vez por outra tinge de vermelho nosso chão. E desse chão nascerão novos lutadores e lutadoras que saberão que nossa resistência foi acima de tudo, a chama que mesmo enfraquecida permitirá queimar esse mundo e sua perversa lógica para que possamos fazer por nossas próprias mãos o futuro que desejamos.
Para concluir, hoje chorei. Chorei ao ver esta fotografia, tirada no Rio de Janeiro, mostrando o pai de uma das reféns, consolar em seus braços a mãe do sequestrador que foi abatido pelos policiais cariocas no caso do sequestro do ônibus. Chorei pela forte mensagem de esperança dessa imagem. É isso o que somos, um país onde os de baixo se solidarizam uns com os outros, não o país de patrões cínicos e de pessoas doentes armadas até os dentes que deseja Bolsonaro e seus asseclas.
Viva os lutadores do Brasil!
Viva os trabalhadores!
Viva aos que se opõem à barbárie e não compactuam com o fascismo!

terça-feira, 21 de maio de 2019

Calar-se não é opção

Vivemos tempos vorazes. A defesa da universidade pública, dos direitos dos trabalhadores e a luta por uma lógica diferente da que se quer nos enfiar goela abaixo exige envolvimento, entrega e dedicação, o que tem por vezes me levado a afastar-me deste espaço. 
O governo que está aí é constituído por forças abertamente hostis à qualquer atuação do Estado, principalmente àquelas que dizem respeito a diminuição das desigualdades. E por quê? Porque o sistema defendido pelas forças que elegeram este governo é o sistema que precisa produzir e perpetuar a desigualdade para garantir sua existência. 
Durante a última década, o crescimento econômico trouxe junto consigo uma série de ideias, importadas principalmente dos EUA, que buscaram exacerbar o individualismo e retirar o sentido do coletivo, principalmente das pessoas mais talentosas e criativas. Tal como ervas daninhas que vicejam do dia para a noite, um "espírito" empreendedor passou a se apossar dos brasileiros, em uma febre que gerou milhares de quiosque de comida, pontos de açaí, food trucks, entre outros... 
Acompanhamos com assombro a goumertização das barbearias, dos botequins e de outros ramos mais, que aprenderam a oferecer o mesmo serviço por um preço mais elevado, em troca de uma repaginada no visual da loja e dos atendentes.
Isso é um problema? Passa a ser no momento em que isso é usado como modelo e padrão para o desenvolvimento de uma nação. Quando ela amplia a relação de luta de todos contra todos, quando ela exalta os que conseguiram em detrimento dos que ficaram pelo caminho.
Essa ideia de: eu consegui pelo meu esforço, muito romantizada, assola o sentimento de coletividade, de comunidade. Acabamos vendo como inimigo os que não conseguem dentro do sistema se pôr de pé e oprimir os demais.
O que o coach não te contou, amiguinho self made man, é que você é só mais um explorado, mesmo sendo CEO da tua micro-empresa. Não tens patrão, mas trabalhas bem mais do que o trabalhador de carteira assinada. Não tens férias, fins de semana e nem horário fixo. Vês pouco a família. Tudo isso para atingir um padrão que o mercado te impôs. E você e acredita que o teu inimigo é o Estado, porque acha que os impostos sugam você.
Deixa eu te contar: a maior parte do que você produz, você faz para vender. E essas vendas dependem da disponibilidade de renda dos clientes. Muitos só podem fazer isso se os impostos de todos puderem fornecer educação, saúde, aposentadoria e outras coisas para uma boa parte da população. Não importa com o que você trabalhe. Esse é um ciclo no qual você está inserido.
Por isso precisamos defender a educação, a saúde, a previdência e outros direitos. Por isso temos que defender o Banco do Brasil, os Correios, a Caixa, a Petrobrás e outras empresas públicas. Esse é o motivo de que precisamos tomar as ruas para defender a Universidade Pública e gritar que precisamos de mais educação pública, gratuita, de qualidade e socialmente referenciada!
Por isso que, neste momento, calar-se não é uma opção. 

terça-feira, 14 de maio de 2019

Reflexões sobre a universidade


Trabalho em uma universidade federal. Tenho contato diário com estudantes, professores, técnicos, terceirizados, enfim, com quem constrói a universidade pública. Tenho ouvido e visto muita coisa. Histórias que se cruzam em um caleidoscópio rico em matizes dos mais diversos. Perspectivas que são transformadas, ampliadas, sonhos que se concretizam, e muito, muito mais.

E tudo isso acompanhado por temores, dificuldades, angústias... angústias como a de jovens como a que eu conversei ontem, que me dizia ter medo de terminar a graduação, não conseguir emprego e ter que voltar de mãos abanando para a comunidade sertaneja da qual saiu para fazer faculdade. Como a do outro que, mesmo com bolsa e auxílios, não sabe como continuar a fazer seu curso, porque tem família que precisa da sua ajuda, agora, enquanto indivíduo produtivo para aumentar a renda familiar.
Angústias como a do servidor que é mal tratado pela chefia, ou a do que está com familiar doente e não tem quem possa cuidar dele, ou o que tem filhos pequenos... Dificuldades que obrigam quem constrói a universidade  a fazer cotas para comprar papel, caneta, clips, grampos e outros materiais de expediente.
E elas somam-se às diversas expectativas de quem está fora da universidade e quer ter seu espaço, seu lugar ao sol dentro da universidade.
E o que é a Universidade brasileira? A educação superior pública do Brasil?
Por muito tempo foi uma instituição das elites. Esteve longe dos trabalhadores, das classes pobres, dos negros, enfim, dos excluídos da sociedade. Esteve longe do sertão, se concentrando nas capitais e no sul e sudeste do país. Há pouco mais de dez anos ela se abriu. Veio para os rincões, expandiu e, nessa expansão, ela foi se tornando mais negra, mais trabalhadora, mais popular. Passou de sonho dificílimo de alguns, para meta de muitos.
E agora, quando finalmente a universidade se abre a um público amplo, diverso e esforçado, querem que ela acabe. Dizem agora que ela não é mais necessária. Que deve ser restrita a uma elite. Que deve ser restrita em seus cursos, em suas atividades, em seus objetos de pesquisa. Querem que ela volte no tempo. Querem que ela perca sua identidade, agora tão colorida, por aquela velha e embolorada, na qual ela só servia para poucos.
Por isso dizemos não. Queremos que ela avance e não que diminua. Queremos uma universidade democrática, uma universidade à serviço da sociedade brasileira, para diminuir desigualdades e garantir educação de qualidade.
Uma universidade onde a docência não seja precarizada, nem o professor robotizado. Uma universidade onde os técnicos sejam valorizados, com seu papel no Ensino, Pesquisa e Extensão reconhecidos. Onde os alunos sejam vistos como agentes ativos de sua educação. Uma instituição que entenda os terceirizados como integrante de sua comunidade. E onde a comunidade universitária possa seguir adiante num modelo ainda mais inclusivo e que possa fazer a diferença em uma sociedade que, nesses sombrios tempos, parece ter desaprendido a ver no outro o irmão.
Nossas universidades precisam mudar mais. Precisam incluir mais. Para que as angústias, temores e dificuldades, que hoje atravessam possam ser lançadas fora e em seu lugar podermos erigir a universidade necessária: democrática, inclusiva, gratuita, pública de qualidade, em uma palavra: LIVRE

terça-feira, 7 de maio de 2019

Poema solto


Mataram uma mulher na praça,
Mataram outros por causa da raça,
Matam tantos, todo dia,
O machismo, o racismo, a homofobia.

Na TV, um ogro grita:
Pra qualquer problema, atira,
Tortura, mata, castiga

Chega! Aqui estamos para mudar,
Ir às escolas e engajar,
Negar os ódios dos discursos
Dizer que é hora de, a todos, integrar
LGBT, negro e mulher.

Porque é preciso libertar,
As injustiças, negar
E dizer não ao padrão,
Não precisamos de patrão,
O que queremos é o mundo
Sendo impossível ou não.

segunda-feira, 6 de maio de 2019

Uma questão de classe

Que país queremos? Esta é a pergunta que deve ser respondida com sinceridade por todos nós. O Brasil não é só São paulo. Não é só o Nordeste. Não é só o Rio Grande do Sul ou o Rio de Janeiro, não é só a Amazônia, nem os campos do cerrado. O Brasil é tudo isso e muito mais. Mais do que a soma das partes. 
Durante muito tempo, uma especialização absurda levou os investimentos mais qualificados para uma parte do Brasil e deixou outra sem nada. Pior foi o fato de que, mesmo nessas regiões que receberam esses investimentos, apenas a elite se beneficiou das rendas desse surto de desenvolvimento. Uma maioria de brasileiros permaneceu à margem. Continuaram ganhando mal, morando mal, tendo pouco acesso à saúde e educação de qualidade. 
Continuamos a ser uma nação de contrastes e de desigualdades. Desigualdades absurdas. Que provocam ressentimentos e antipatias, entre os diversos segmentos da sociedade brasileira, numa engrenagem, muito bem engendrada, na qual não se enxerga a exploração capitalista como fonte dessas desigualdades e que a superação destas passa pela superação do modo capitalista de produção. 
Uma estrofe da versão em português da Internacional Comunista diz: "nós fomos de fumo embriagados", em nossa realidade fomos embriagados de TV, de igrejas da teologia da prosperidade,. de coaches e de outras coisitas mais. Eles preparam uma fábula, fábula essa que diz que nada mais importa a não ser o seu desejo, a sua vontade. Por meio dela você terá asas para saltar sobre o abismo que separa ricos e pobres, a meritocracia seria a ferramenta mágica, quase uma varinha de condão, para fazer dos seus sonhos uma doce realidade, por meio dessa fábula, aprendemos que mesmo sendo a gata borralheira, ainda teremos nosso final feliz. 
Tudo tão clichê! A realidade não bate com o que te contam na TV. É bem diferente do que te falou o teu pastor. Não importa o quanto você pense positivo, não vai dar pra reprogramar teu DNA para te fazer um vencedor, como aconselhou teu coach... 
Precisamos é pensar como classe. Conscientizarmo-nos que estamos na base da pirâmide e sobre nós rapinam uma classe improdutiva, que nada produz, mas tudo consome, enquanto regra as migalhas que deixa cair de suas mesas para os de baixo. 
A tua micro-empresa, amigo, não te faz parte da classe burguesa. Ela te afunda mais e mais entre os que vendem de forma precarizada a força de trabalho. Por um pouco mais de dinheiro, você deixa de passar fins de semana com a família, trabalha até mais tarde e vê-se obrigado a trabalhar até uma idade avançada. E para quê? Para viver sufocado entre as dívidas e os pedidos cada vez mais exigentes de clientes que não o veem enquanto ser humano, mas como um CNPJ. Impessoal. Descartável. 
Mas não é só a ME. Tem o MEI, tem a faccionista, tem o UBER, o Ifood e sei lá mais quantos aplicativos ou formas de exploração que te impõe e que você pensa que está bem, porque alimenta tua ilusão de não ter patrão e fazer o teu horário. 
Precisamos reaprender que a sociedade tem apenas duas classes: a dos que trabalham, onde estão todos vocês, mesmo os que fazem cartãozinho se chamando de CEO, da empresa que montou no quintal com o tio e o vizinho e a dos que, sem fazer nada, lucram nos colocando para trabalhar. É essa gente que tem interessa em retirar direitos, é essa gente que quer acabar com a educação pública, gratuita e de qualidade. É essa gente que hoje está no governo e que, como velhas raposas que são, usam os conhecidos loroteiros (já falamos deles, lembra? A TV, o pastor, o coach, etc...) para não te deixar quebrar suas correntes. 
Podemos ser livres. Livres de verdade. O primeiro passo é reconhecer qual o meu lado e ocupar meu lugar na trincheira. 

segunda-feira, 14 de janeiro de 2019

Segurança pública para quem? ou o ajuste liberal vai ser mais pólvora no incêndio

Virou rotina na capital alencarina os ataques de criminosos contra prédios públicos, ônibus e a instalação do caos nas periferias, onde moradores ficam ilhados pela ausência dos transportes públicos e pela própria inércia do governo que preocupa-se em salvaguardar as áreas nobres e turísticas da cidade.
Assim, os primeiros dias de 2019 pareciam trazer mais do mesmo para a população. No entanto, o caos desse início de ano não se limitou à Fortaleza. Um pouco mais de 40 cidades em todo o estado  sentiram a força das facções. Cidades pequenas e médias, pouco habituadas a ações que antes só tomavam conhecimento pela TV, viram de uma hora para outra a sua rotina abalada por explosões, incêndios e tiroteios.
A situação a que chega o estado do Ceará é ainda mais inusitada ao se recapitular que os últimos governos, os dois de Cid e o primeiro de Camilo, representaram anos de investimento no aumento do efetivo policial, na expansão do RAIO e na construção de novos presídios e delegacias. Um investimento maciço em um modelo falido, um modelo que contrapõe à violência dos criminosos a violência do Estado. Um modelo que coloca os trabalhadores e a população mais pobre bem no meio do fogo cruzado.
Na verdade, o caminho adotado pelos últimos governos ignora a desigualdade marcante existente no Ceará e se propõe simplesmente a reprimir sem dialogar com a população. Essa falta de diálogo termina por alimentar o crime, pois as classes alta e média continuam a consumir as drogas e a ser receptadora de produtos ilícitos, enquanto as classes desfavorecidas se tornam a mão de obra a ser recrutada pelas facções.
Muitos jovens se encontram sem perspectivas em uma sociedade cada vez mais individualista e preconceituosa. Dentro de uma conjuntura de difícil sobrevivência, a filiação a facções é um dos poucos caminhos vislumbrados  para ter uma condição de vida melhor. Afinal, onde conseguir 1000 reais por um serviço rápido, tal como as facções ofereciam para quem realizasse ações como a queima de ônibus?
Aliada a isso, existe uma leniência em relação ao combate aos líderes do tráfico. Estes não se encontram nas favelas e periferias. Engraçado como se busca endurecer contra os pequenos traficantes e os chamados aviões e quase nada é feito contra os barões da droga e do tráfico de armas que municia os exércitos das facções.
A população vive amedrontada, de um lado as facções e seu poder ilegal, de outro a truculência policial. Policiais esses que não conseguem se visualizar enquanto parte da classe explorada, se comportando como braço armado da burguesia, reprimindo outros trabalhadores.
Interessante que mais armas,mais policiais, mais presídios nas duas últimas décadas nos trouxeram exatamente a essa situação. Uma evidência empírica de que está errado fazer apenas isso. Ações coordenadas de recuperação da cidadania e de combate a desigualdade social, junto com as medidas que foram implementadas teriam tido um resultado melhor. Investir também em mais inteligência policial seria bem mais efetivo.
É preciso uma outra polícia.. Uma outra política de segurança pública. É preciso fazer secar as fontes de recursos do tráfico, com a legalização lenta e gradual de certas substâncias.
2019 abre-se uma nova fase no Brasil, onde a exploração capitalista tende a se acentuar, tornando o trabalho ainda mais precário e ampliando ainda mais o fosso entre ricos e pobres. O desmonte da previdência e a arrancada de direitos deve ser combatidas por serem danosas à sociedade e por contribuírem ainda mais para a situação preocupante da violência em nossas cidades. O ajuste neoliberal joga mais pólvora sobre a fogueira que arde no país.