quarta-feira, 4 de janeiro de 2017

Noite sem sono

É noite. O calor não me deixa pegar no sono. O ventilador joga um ar quente, abafado sobre mim. levanto da cama. Não olho o relógio. Sei que é tarde. O movimento da rua se exaurira por completo, mesmo a algazarra das crianças silenciou a muito tempo.
Estou sozinho e penso nela. Quilômetros nos separam. O que andará fazendo? Neste horário deve estar dormindo. Eu é quem, como um notívago, teimo em ficar acordado, mesmo tendo que ir ao trabalho pela manhã.
Vou até a janela. A lua brilha espectral. Tem uma estrela enorme ao lado dela. Provavelmente um planeta. Marte ou Vênus? Não interessa. Olho para o outro lado e vejo o recorte escuro da Colina do Horto em meio a noite ainda mais escura. Luzes serpenteiam a colina desde a base até o alto onde fica a estátua de Padre Cícero. Lá em cima, penso, deve estar mais fresco.
Suspiro fundo. Folheio um livro. Me descubro sem paciência para ler, depois de ter passado a vista sobre quatro ou cinco páginas sem atinar com o sentido do que lia. O coração samba no meu peito. A garganta aperta e os olhos marejam. Tudo que eu quero é um noite de sono tranquila.
Ligo a TV. Zapeio os canais em busca de amenidades. Mais do mesmo na programação da madrugada: desenhos, séries sem graça, programas de vendas e os infalíveis tele-evangelismos. A felicidade a um clique de distância. Lembrei de quando colocava o copo com água ao lado do televisor preto e branco que tínhamos em casa quando era criança, para que o pastor orasse e abençoasse o copo com água. Bebia sôfrego daquela água e saía de casa para a escola como se fosse o garoto mais abençoado do mundo. Ri ao me lembrar disso.
Quão crédulos somos? Em todas as épocas,em todos os lugares sempre encontraremos pessoas dispostas a acreditar. Por que? Porque precisamos. Nossa devida depende disso. Queremos acreditar que há um ser superior que cuida de nós. Precisamos dele para justificar nossos sucessos e precisamos ainda mais dele para o culparmos por nossos fracassos.
Precisamos acreditar que o Capitalismo não é tão mau. E que se trabalharmos duro, chegaremos ao topo da pirâmide. Precisamos acreditar que o estelionatário tem realmente uma proposta maravilhosa pra mim, que nunca ninguém aproveitou antes. E lhe entrego o que tenho.
Somo engraçados. Vivemos de correr atrás do vento, esquecendo-nos de que somos peregrinos nesta terra e que para onde vamos, não levamos nada. No entanto continuamos dia após dia utilizando toda a nossa força, todo o nosso entendimento a entesourar coisas. De todos os tipos: dinheiro, imóveis, poder. Uma imensa quantidade de tralhas que não significam nada para você. Só consumo.
Volto para a cama. Fecho os olhos. O calor é tão intenso que parece palpável. Vou tomar um banho e quem sabe, com sorte, deitando molhado eu pegue no sono.

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