quinta-feira, 5 de janeiro de 2017

O Fausto de Goethe sob o olhar de Berman

Texto publicado no Administradores.com em 20/07/2014.

Em "Tudo o que é sólido desmancha no ar", Berman utiliza obras literárias para traçar um pouco da história da modernidade. 
O primeiro capítulo aborda a obra de Goethe, “Fausto”, onde Berman foca no que ele chamou de a tragédia do desenvolvimento. Em sua análise da obra, ele dividiu “Fausto” em três partes que representam um crescendo nas perspectivas modernistas de Goethe, assim, somos apresentados a três “metamorfoses” de Fausto: ele se torna o sonhador, o amador, e, por fim, o fomentador.

Cada uma destas metamorfoses de Goethe, são também metamorfoses da sociedade europeia, à época do autor de Fausto. São formas como a sociedade europeia viu e encarou o modernismo, aceitando-o como o passo necessário para o desenvolvimento e o fim de um passado de trevas que devia ser sepultado a qualquer custo em nome das vantagens que se abriam para a humanidade.
Fausto deseja mais do que realizar um espetáculo, mais do que contemplar e conhecer a natureza, ele deseja domá-la, transformá-la, no entanto para tanto faz-se necessário, que ele próprio transforme-se completamente e torne-se algo novo, diferente do que era antes, para que assim ele possa realizar seu desejo.

A personagem de Mefistófeles vem até ele justamente para isso, para leva-lo a dar o passo necessário para a realização de seus anseios. Pode-se ver então que não foi Mefisto quem transformou a índole de Fausto, mas o próprio é que aos poucos vai se desprendendo de tudo em busca da realização de seu objeto. Ele entra em choque com o mundo tradicional e o vence, mostrando assim o próprio embate dos modernos contra a velha ordem, que vai acabar por subvertê-la.
Fausto aprende a destruir e a construir e começa assim a mostrar a típica voracidade do capitalismo, que destrói tudo o que toca para fazer erguer-se algo novo. A fábula Goetheana é a fábula do desenvolvimento do Capitalismo, que inicia cheio de aspirações para si e para o povo, cria uma ideia de liberdade e de progresso e que por fim, tende a destruir tudo o que se lhe opõem, para cumprir suas promessas. 
A forma como Fausto e Mefisto negociam com o Imperador, pela concessão das terras nas quais Fausto deseja desenvolver seu ímpeto criador, não deixa de apresentar mais uma face do Capital, do princípio do século XIX: já não se faz preciso uma revolução política! Acordos e negociações podem silenciar povos e nações apenas para o benefício de grupos e indivíduos em nome do progresso. Como diz Berman “[...]todas as barreiras humanas e naturais caem diante da corrida pela produção e a construção”. É interessante que fica difícil dissociar em Fausto diferenças sensíveis entre o modernismo e o Capitalismo, e é essa relação que se sobressai: o moderno surge da voraz necessidade do capitalismo por novos mercados, novas relações sociais e mesmo novos seres humanos.
Detenho-me por aqui... Berman no entanto continua, abordando Marx, Baudelaire e muitos outros. Uma obra que nos leva a pensar e a repensar o mundo que vivemos, afinal nós estamos vivendo nessa modernidade e necessitamos, como diz o autor de tudo o que é sólido desmancha no ar, criar maneiras de nos sentirmos em casa neste mundo moderno. 

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